Capaz de
diminuir o número de partículas virais da dengue em células de mosquito, vírus
descoberto por pesquisadores de Estados Unidos e Brasil pode ajudar a entender
como funciona o ciclo evolutivo da doença.
Por: Mariana Rocha
Publicado em 20/03/2012 |
Atualizado em 26/03/2012
Ao infectar células do mosquito
transmissor da dengue, o novo vírus diminui as partículas virais que causam a
doença. A descoberta pode ajudar a entender como funcionam os mecanismos
envolvidos no ciclo da infecção humana. (imagem: Ricardo Vancini/ JVI)
A descoberta aconteceu por acaso. Na tentativa de
saber mais sobre a dengue, pesquisadores da Universidade Federal do Rio de
Janeiro (UFRJ) enviaram uma amostra contendo o vírus causador da dengue tipo 2 (DEN-2)
para a Universidade Estadual da Carolina do Norte, nos Estados Unidos, onde o
biólogo brasileiro Ricardo Vancini faz seu PhD. Após análise em microscopia
eletrônica, a atenção da equipe se voltou para a presença de um vírus nunca
antes descrito e que pode elucidar questões importantes sobre o ciclo evolutivo
da doença.
“Inicialmente, pensamos que era
uma nova cepa do vírus da dengue, mas logo percebemos que sua morfologia era
muito diferente do DEN-2”, diz Davis Ferreira, virologista do Instituto de
Microbiologia da UFRJ e um dos autores do estudo que ganhou a capa da edição de março do Journal
of Virology.
Além de ser estruturalmente distante do vírus da
dengue, a caracterização do genoma do Espírito Santo Vírus (ESV) – homenagem ao
estado de origem da amostra em que foi encontrado – confirmou a presença de um
exemplar nunca antes descrito. Aparentemente, seu material genético apresenta
organização similar à da família dos birnavírus, a qual abriga uma espécie que
infecta moscas do gênero Drosophila.
Para entender os mecanismos de infecção do novo
vírus, os cientistas inocularam partículas do ESV em cultura de células da
larva do Aedes albopictus, mosquito que, assim como com seu parente mais
conhecido Aedes aegypti, transmite a dengue. O ESV, da mesma forma que o
DEN-2, mostrou-se capaz de infectar as células do inseto e esse experimento
originou um dos pontos cruciais da pesquisa: a relação direta do ESV com o
vírus da dengue tipo 2.
Expectativas e preocupações
Durante a infecção das células, os pesquisadores
perceberam que o ESV possui maior sucesso na sua replicação quando invade
células infectadas pelo DEN-2. Quando já está usufruindo dos mecanismos
celulares para se multiplicar, o ESV impede a montagem das partículas de DEN-2,
diminuindo a quantidade desse vírus dentro da célula.
A
descoberta de um vírus que elimina a dengue ainda dentro do vetor pode se tornar
uma grande aliada da ciência
Como o controle do mosquito transmissor da dengue
tem se tornado cada vez mais difícil em função de sua resistência a diversos
inseticidas, a descoberta de um vírus que elimina a dengue ainda dentro do
vetor pode se tornar uma grande aliada da ciência.
No entanto, muitas questões ainda rondam a
descoberta, pois não se sabe se o ESV pode ser responsável por algum dos
sintomas atribuídos ao vírus da dengue durante a infecção. Por isso, é
importante entender como o ESV e o vírus da dengue interagem.
A microscopia eletrônica permite
identificar as diferenças entre o vírus da dengue (à esq.) e o Espírito Santo
Vírus (à dir.). Apesar de ambos apresentarem geometria semelhante a uma bola de
futebol, o ESV é mais estável e sua estrutura é mais visível que a do vírus da
dengue. (imagem: Ricardo Vancini)
Por outro lado, o estudo gerou preocupações e
perguntas cujas respostas já estão sendo pesquisadas. Após encontrar o Espírito
Santo Vírus, os cientistas questionaram a possível presença de outros vírus em
amostras que, teoricamente, só continham o da dengue. “Esse tipo de coinfecção
pode dificultar o estudo de proteínas para a criação de vacinas contra a
doença, além de prejudicar a interpretação do diagnóstico”, explica Ferreira.
Mariana Rocha
Ciência Hoje On-line
Acesso em
27/03/12
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